Escolher o regime de bens na união estável é uma decisão que impacta diretamente seu patrimônio, sua família e seu futuro. É comum surgirem dúvidas: “Se não fiz contrato, qual regime vale?”, “Meus bens anteriores entram na partilha?”, “Podemos mudar o regime depois?”, “E quando há filhos, empresas, imóveis financiados ou heranças?”.
Neste artigo, vou te explicar de forma clara, prática e juridicamente correta como funcionam os regimes de bens na união estável, quando e como formalizar um contrato de convivência, quais as consequências patrimoniais de cada escolha e em que situações é indispensável buscar apoio de um advogado. A ideia é que você termine a leitura com segurança para tomar decisões conscientes e evitar conflitos no futuro.
Explicação conceitual e legal
O que é união estável
A união estável é reconhecida pela Constituição Federal como entidade familiar (art. 226, § 3º), e regulamentada pelo Código Civil (arts. 1.723 a 1.727). Em resumo, é a convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, estabelecida com o objetivo de constituição de família.
Pontos fundamentais:
- Não há exigência de prazo mínimo de convivência nem de filhos.
- Pode existir união estável mesmo sem coabitação, desde que estejam presentes os elementos de publicidade, continuidade, estabilidade e intenção de formar família.
- Pode ser formalizada por Escritura Pública de União Estável em cartório ou reconhecida judicialmente.
O regime de bens padrão (na falta de contrato)
O Código Civil determina, no art. 1.725, que, na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
Isso significa:
- Se vocês não firmaram contrato de convivência definindo outro regime, vale a comunhão parcial.
É possível escolher outro regime?
Sim. O casal pode, por contrato escrito (preferencialmente por Escritura Pública de Contrato de Convivência), eleger o regime que desejar, nos limites da lei. Em geral, são admitidos na união estável os mesmos regimes do casamento:
- Comunhão parcial de bens (padrão)
- Comunhão universal de bens
- Separação total de bens (convencional)
- Participação final nos aquestos
- Regimes mistos (cláusulas personalizadas), desde que respeitem a ordem pública e direitos de terceiros
Separação obrigatória de bens: quando pode ocorrer
O art. 1.641 do Código Civil prevê hipóteses de separação obrigatória (legal) de bens no casamento, como:
- pessoas maiores de 70 anos;
- casamento com inobservância das causas suspensivas;
- quem depende de suprimento judicial para casar.
Na união estável, há forte entendimento jurisprudencial pela aplicação analógica dessas hipóteses, especialmente quanto à idade igual ou superior a 70 anos. Em termos práticos:
- Se um dos companheiros tem 70 anos ou mais, há sério risco de o regime aplicável ser, por força de decisão judicial, o da separação obrigatória de bens, mesmo que o contrato de convivência diga o contrário.
- Em separação obrigatória, a tendência dos tribunais é reconhecer a comunicação apenas do que foi adquirido durante a união com esforço comum comprovado, tema que frequentemente exige discussão em juízo.
Dica: se houver idade avançada, busque orientação jurídica personalizada antes de assinar qualquer contrato.
Regimes de bens em linguagem simples
- Comunhão parcial: comunicam-se os bens adquiridos onerosamente durante a união. Em regra, não entram bens que cada um já possuía antes, nem os recebidos por doação/herança com cláusula de incomunicabilidade.
- Comunhão universal: comunicam-se, como regra, os bens presentes e futuros de ambos, com exceções legais (como doações/heranças com cláusula de incomunicabilidade e obrigações pessoais).
- Separação total: cada um mantém patrimônio separado, antes, durante e depois da união.
- Participação final nos aquestos: durante a união, cada um administra o seu; na dissolução, há apuração e partilha do que foi adquirido onerosamente durante a convivência (aquestos). É um regime híbrido.
União estável e sucessão (herança)
O Supremo Tribunal Federal equiparou, para fins sucessórios, o companheiro ao cônjuge. Em termos práticos:
- O companheiro passou a ter direitos sucessórios semelhantes aos do cônjuge, aplicando-se o art. 1.829 do Código Civil (ordem de vocação hereditária).
- Isso impacta planejamento sucessório, testamentos e partilhas. Em muitas situações, a legítima (metade do patrimônio) deve ser preservada para herdeiros necessários, entre eles o cônjuge/companheiro, conforme entendimento que tem sido adotado pelos tribunais.
Atenção: regras sucessórias podem interagir com o regime de bens escolhido. Planejamento prévio evita surpresas.
Dívidas e obrigações
- Em comunhão parcial, dívidas assumidas durante a união para benefício do casal tendem a ser consideradas comuns.
- Em separação total, em regra, cada um responde por suas dívidas, salvo se houver coobrigação ou proveito comum demonstrado.
- Sempre há espaço para discussão judicial sobre a finalidade da dívida.
Empresas e quotas societárias
- Comunhão parcial: em linhas gerais, pode haver comunicação do valor econômico das quotas adquiridas onerosamente durante a união, mas isso não implica que o companheiro se torne sócio automaticamente. O que se discute é o valor (meação), não a condição de sócio.
- Separação total: tende a manter o patrimônio empresarial completamente apartado, facilitando governança e sucessão.
- Em qualquer regime, é possível prever cláusulas e pactos societários para disciplinar efeitos patrimoniais, direito de preferência e liquidez em caso de dissolução.
É possível mudar o regime depois?
- Na união estável, admite-se, por analogia ao art. 1.639, § 2º (do casamento), a alteração do regime por novo contrato escrito.
- Por segurança e eficácia perante terceiros, recomenda-se Escritura Pública e a devida publicidade (registro em Títulos e Documentos e, quando envolver imóveis, averbação nas matrículas).
- Em regra, a mudança tem efeitos para o futuro (ex nunc), preservando o que foi adquirido sob o regime anterior.
Exemplos práticos
- João e Maria vivem juntos há 6 anos, nunca formalizaram contrato de convivência.
- Regra: aplica-se a comunhão parcial de bens (art. 1.725 do CC).
- Compraram um apartamento financiado no 3º ano da união, só no nome de João.
Como fica? Em princípio, as parcelas pagas durante a união comunicam-se. Se a separação ocorrer, partilha-se o valor proporcional ao que foi amortizado durante a convivência, abatendo dívidas, despesas e valorização conforme o caso.
- Ana, empresária, e Pedro, médico, vão iniciar união estável e querem evitar discussão sobre quotas da empresa de Ana.
- Solução típica: contrato de convivência com separação total de bens.
- Complementos úteis: testamento para garantir proteção afetiva, seguro de vida, e eventual pacto societário prevendo liquidez/indenização em hipóteses de dissolução.
- Roberto, 72 anos, e Carla, 60, pretendem formalizar união estável e desejam comunhão universal.
- Alerta: pode incidir separação obrigatória por analogia ao art. 1.641, II (maior de 70 anos).
- O contrato de convivência pode ser questionado judicialmente, e a comunicação patrimonial pode acabar limitada ao esforço comum. É essencial aconselhamento jurídico antes de assinar.
- Luísa recebeu herança de um imóvel durante a união com Carlos, sob comunhão parcial.
- Regra: herança não entra na comunhão, mas os frutos (aluguéis) percebidos durante a união tendem a comunicar-se, salvo disposição em contrário imposta pelo doador/testador.
- Beatriz e Rafael, cada um com filhos de relações anteriores, querem proteger patrimônios já constituídos e, ao mesmo tempo, garantir cuidado mútuo.
- Estratégia: separação total com testamento recíproco dentro dos limites da legítima, seguros/beneficiários e, se desejado, cláusulas de incomunicabilidade em futuras doações a filhos, para blindagem intergeracional.
Quadro comparativo dos regimes de bens na união estável
| Regime | Como funciona | O que comunica |
|---|---|---|
| Comunhão parcial | Regime padrão na falta de contrato; administração conjunta do que for comum e individual do que for particular | Bens adquiridos onerosamente durante a união; frutos de bens particulares percebidos na constância, salvo estipulação diversa |
| Comunhão universal | Comunicação ampla do patrimônio, com exceções legais | Em regra, todos os bens presentes e futuros, exceto bens legalmente incomunicáveis (ex.: heranças com cláusula) |
| Separação total (convencional) | Patrimônios independentes; cada um administra e responde pelos seus bens e dívidas | Em regra, nada se comunica, salvo se adquirido em condomínio voluntário ou acordo específico |
| Participação final nos aquestos | Durante a união, separação; na dissolução, apuração dos aquestos para partilha | O montante adquirido onerosamente na constância, apurado no final, com compensações |
| Separação obrigatória (legal) | Imposta por lei em hipóteses específicas; aplicada por analogia em muitas decisões à união estável | Em geral, não há comunicação automática; tribunais costumam exigir prova de esforço comum |
Dicas práticas e orientações preventivas
- Formalize por escrito
- Faça Escritura Pública de Contrato de Convivência em cartório de notas para escolher ou ajustar o regime de bens.
- Isso dá segurança jurídica, reduz disputas e facilita a prova da vontade do casal.
- Dê publicidade adequada
- Registre o contrato no Cartório de Registro de Títulos e Documentos para produzir efeitos perante terceiros.
- Se houver imóveis, averbe a existência do contrato na matrícula do imóvel, garantindo oponibilidade e transparência a credores e compradores.
- Seja específico nas cláusulas
- Defina o que é bem particular de cada um.
- Estabeleça regras sobre administração e alienação de bens de maior valor.
- Preveja como lidar com:
- imóveis financiados;
- investimentos (ações, fundos, criptoativos);
- quotas societárias (avaliação e liquidez);
- frutos e rendimentos (aluguéis, dividendos);
- dívidas e despesas correntes;
- benfeitorias em bens particulares;
- uso exclusivo de imóvel comum e aluguel compensatório em caso de separação;
- pets, coleções, bens digitais e propriedade intelectual.
- Planejamento sucessório integrado
- O regime de bens conversa com testamentos, doações, seguros e previdência privada.
- Pense em: testamento dentro dos limites da legítima, cláusulas de incomunicabilidade em doações a filhos, apólices com beneficiários atualizados e eventual holding para organização patrimonial.
- Atenção à idade e à separação obrigatória
- Se um dos companheiros tiver 70 anos ou mais, procure orientação técnica. Há risco real de prevalecer a separação obrigatória por decisão judicial, afetando a comunicação dos bens.
- Tenha provas da união estável
- Guarde documentos que demonstrem convivência pública e contínua: contas no mesmo endereço, plano de saúde familiar, fotos, viagens, declarações em órgãos públicos, dependência em imposto de renda, etc.
- A Escritura Pública Declaratória de União Estável também é útil como prova.
- Atualize o contrato quando a vida mudar
- Comprou empresa? Recebeu herança? Nasceu filho? Mudou a situação financeira? Avalie revisar o contrato de convivência.
- Mudanças costumam valer para o futuro, preservando o passado.
- Proteja o imóvel de família
- Se residirem em imóvel comum, avalie cláusulas sobre venda, preferências de aquisição e proteção da moradia em caso de separação, especialmente quando houver filhos menores.
- Cuidados com dívidas e fianças
- Evite prestar fiança sem reflexão. Dependendo do regime, a fiança pode afetar o patrimônio familiar.
- Em muitos casos, exigir anuência do companheiro para certas garantias agrega proteção.
- Em casos de empresas e profissionais liberais
- Preveja metodologia de avaliação (valuation) em caso de dissolução, evitando litígios sobre “quanto vale” a empresa.
- Combine critérios objetivos (EBITDA, múltiplos, laudo de perito, data de corte).
- Documente aportes e reformas
- Se um investe na reforma do bem particular do outro, documente o aporte (contrato/recibos) para permitir compensação justa se a união terminar.
- Previdência, seguros e benefícios
- Atualize beneficiários de seguros e previdência privada; verifique regras de resgate e sucessão.
- Ajuste o regime de bens com esses instrumentos para garantir proteção efetiva.
Quando procurar um advogado
- Para elaborar um Contrato de Convivência ou Escritura de União Estável: trata-se de ato técnico que exige análise individual dos bens, objetivos do casal e limites legais.
- Quando houver patrimônio relevante, empresas, heranças, filhos de relações anteriores ou pessoas com 70 anos ou mais.
- Para alterar o regime de bens: a forma adequada e a publicidade correta evitam nulidades e litígios.
- Em situações de separação/dissolução: partilha, guarda, alimentos e uso de imóvel exigem estratégia e proteção jurídica.
- Para planejamento sucessório e proteção patrimonial integrada (regime, testamento, doações, seguros, holdings).
Atos como consultoria jurídica individualizada, elaboração de contratos e atuação em processos judiciais são privativos de advogados regularmente inscritos na OAB. Buscar apoio profissional traz segurança, reduz riscos e previne perdas financeiras e emocionais.
Conclusão
A união estável é uma forma legítima e reconhecida de constituir família, e o regime de bens escolhido (ou o regime que entra automaticamente, se nada for pactuado) molda como o patrimônio do casal será formado, administrado e partilhado.
Pontos-chave para levar com você:
- Sem contrato, vale a comunhão parcial (art. 1.725 do CC).
- É possível escolher outro regime por contrato escrito (preferencialmente por Escritura Pública), inclusive com cláusulas sob medida.
- A separação obrigatória pode ser aplicada por analogia em determinadas hipóteses, especialmente para maiores de 70 anos — atenção redobrada.
- Planejamento preventivo e documentação clara evitam litígios e protegem o que é mais importante para vocês.
- Para casos com empresas, heranças, filhos de relações anteriores ou patrimônio significativo, o acompanhamento jurídico é essencial.
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