Separação não precisa ser sinônimo de conflito — especialmente quando existem filhos. Um bom plano de convivência organiza, com clareza e antecedência, como será a rotina da criança com cada genitor, quem decide o quê, como serão férias, feriados, viagens, comunicação, despesas e transições. Na prática, ele evita discussões recorrentes (“de quem é o próximo fim de semana?”, “quem busca na escola?”, “pode viajar?”) e dá previsibilidade para todos, sobretudo para a criança, que é quem mais precisa de estabilidade.
Se você tem dúvidas sobre guarda compartilhada, diferença entre plano de convivência e “direito de visitas”, como lidar com feriados ou o que fazer quando os pais moram em cidades diferentes, este guia explica tudo de forma simples e oferece um modelo prático que você pode usar como base para construir um acordo sólido e equilibrado.
Explicação conceitual e legal
O que é plano de convivência
Plano de convivência é o documento, preferencialmente acordado entre os genitores e homologado judicialmente, que define a rotina da criança ou adolescente com cada responsável: tempo de convivência, regras de comunicação, saúde, escola, férias, feriados, viagens, despesas, transições e mecanismos de prevenção e solução de conflitos. Ele concretiza, no dia a dia, o melhor interesse da criança.
Base legal essencial
- Constituição Federal, art. 227: prioridade absoluta à proteção integral de crianças e adolescentes, assegurando convivência familiar.
- Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA):
- Art. 4 e art. 6: proteção integral e primazia do interesse da criança.
- Art. 19: direito à convivência familiar e comunitária.
- Art. 83 e art. 84: regras de viagens nacionais e internacionais de crianças e adolescentes (autorização do outro genitor ou judicial, salvo exceções).
- Código Civil:
- Art. 1.583 e 1.584 (alterados pela Lei 13.058 de 2014): guarda unilateral e guarda compartilhada; a guarda compartilhada é a regra, sempre que possível, mesmo sem acordo entre os pais, desde que atenda ao interesse da criança.
- Art. 1.589 (alterado pela Lei 12.398 de 2011): direito de convivência estendido aos avós, a critério do juiz e conforme o melhor interesse da criança.
- CPC de 2015 (Ações de Família, arts. 693 a 699):
- Art. 694 e 695: estímulo à mediação e conciliação como primeira via.
- Art. 699: oitiva da criança e do adolescente, com apoio de equipe interprofissional, quando pertinente.
- Lei 12.318 de 2010 (Alienação Parental): prevê medidas para coibir condutas que prejudiquem a formação psicológica da criança, como campanha de desqualificação do outro genitor e obstrução do convívio.
Conceitos-chave, sem juridiquês
- Guarda compartilhada: não significa “meio a meio” de tempo, e sim corresponsabilidade. Ambos participam das decisões relevantes (saúde, educação, religião, mudança de cidade), mesmo havendo residência de referência.
- Residência de referência: o endereço-base da criança, para fins de rotina e documentação. Não impede convivência ampla com o outro genitor.
- Regulamentação de convivência: as regras práticas do contato (semanas, fins de semana, feriados, férias, horários, transições, comunicação).
- Melhor interesse da criança: critério orientador absoluto. Se um ajuste “arruma” a vida dos adultos, mas desorganiza a da criança, ele é inadequado.
Por que homologar judicialmente
Um acordo extrajudicial, mesmo assinado, pode gerar dúvidas de execução. Ao homologar o plano de convivência no Judiciário, ele se torna título executivo judicial (CPC, art. 515, inciso II), com força para cumprimento e execução em caso de descumprimento, além de facilitar a intervenção do juiz se for preciso rever cláusulas. Nos temas de criança e adolescente, a chancela judicial também confere maior segurança e controle de legalidade, sempre sob o olhar do melhor interesse do menor.
Exemplos práticos e situações comuns
1) Pais na mesma cidade, rotinas parecidas
João e Maria moram a 15 minutos um do outro. A filha Ana, 7 anos, tem escola integral e balé às terças e quintas.
- Semana: Ana dorme na casa de Maria de segunda a quinta.
- Fins de semana: alternados, com retirada na sexta após a escola e devolução no domingo às 18h.
- Feridos e datas comemorativas: alternância anual (um ano com pai, outro com mãe), com horários definidos para Natal, Ano Novo, Dia das Mães e Dia dos Pais.
- Férias: 30 dias escolares divididos em dois períodos de 15 dias alternados, com cronograma definido até 30 de novembro.
- Comunicação: livre por chamada de vídeo às 19h, de até 15 minutos, nos dias em que Ana não está com o outro genitor.
Resultado: previsibilidade e equilíbrio, sem judicialização desnecessária.
2) Pais em cidades diferentes
Pedro mudou de cidade a trabalho. O filho Lucas, 9 anos, reside com Ana (mãe).
- Convivência concentrada em fins de semana alternados prolongados (quinta à noite a domingo), a cada 4 semanas, com responsabilidade de Pedro pelo transporte aéreo e terrestre.
- Férias de julho: 20 dias com Pedro.
- Janeiro: 15 dias com Pedro.
- Feriados prolongados pré-definidos por sorteio e alternância semestral.
- Comunicação remota diária às 20h, com flexibilidade por fuso.
Resultado: embora o convívio semanal seja limitado pela distância, mantém-se vínculo qualitativo e períodos prolongados.
3) Bebês e crianças pequenas
Crianças pequenas precisam de rotina mais estável. Julia, 2 anos, ainda está no desmame noturno.
- Convivência com o pai em janelas curtas, porém frequentes: 3 visitas semanais, com duas tardes e um sábado de 10 às 18h.
- Ampliação gradual: ao completar 3 anos, início de pernoites quinzenais; aos 4 anos, fins de semana alternados completo.
- Regras de alimentação e sono alinhadas com a pediatra.
Resultado: transição suave, respeitando o desenvolvimento infantil.
4) Conflito alto entre os genitores
Se há muita tensão, o plano deve ser ainda mais detalhado.
- Pontos de encontro neutros (portaria da escola ou espaço de convivência supervisionado no início).
- Comunicação exclusivamente por aplicativo e e-mail, sem mensagens de madrugada.
- Regras claras contra alienação parental e sanções em caso de descumprimento (registro e comunicação ao advogado, possibilidade de mediação e, se necessário, pedido judicial).
Resultado: redução de contato direto, preservando a criança e diminuindo conflitos.
Quadros comparativos
Guarda, convívio e tempo: o que muda?
| Critério | Guarda compartilhada | Guarda unilateral |
|---|---|---|
| Decisões importantes | Tomadas por ambos os genitores | Tomadas por quem detém a guarda, com dever de informar o outro |
| Tempo com a criança | Flexível; não precisa ser 50-50 | Maior tempo com o guardião; convívio com o outro regulado |
| Residência de referência | Sim, mas não impede ampla convivência | Normalmente coincide com o guardião |
| Melhor interesse da criança | Regra geral, se ambos têm condições | Aplicável quando compartilhada é inviável |
Plano de convivência x “direito de visitas”
| Aspecto | Plano de convivência | Direito de visitas (termo antigo) |
|---|---|---|
| Abordagem | Foco no cotidiano da criança e corresponsabilidade | Foco no tempo do genitor não guardião |
| Conteúdo | Datas, horários, saúde, escola, despesas, comunicação | Geralmente só dias e horários |
| Visão de infância | Centralidade no melhor interesse | Visão adultocêntrica, hoje superada |
Dicas práticas e orientações preventivas
Como construir um plano de convivência equilibrado
- Comece pelo calendário escolar
- Mapeie férias, recessos, provas, atividades extracurriculares e eventos da escola.
- Traga as datas para o plano, prevendo como serão distribuídas.
- Defina a residência de referência e os pontos de transição
- Escolas, consultórios e casas dos genitores são marcos logísticos.
- Prefira transições na escola para reduzir tensões.
- Ajuste o tempo por idade e rotina da criança
- Bebês e crianças pequenas: convivência mais frequente, janelas curtas; pernoites introduzidos com maturidade.
- Crianças em idade escolar: alternância de fins de semana e 1 ou 2 dias na semana com o outro genitor.
- Adolescentes: maior escuta de preferências, compatibilizando com estudo e atividades.
- Preveja feriados, datas comemorativas e aniversários
- Alternância anual é regra prática (ex.: anos pares com um genitor, ímpares com o outro).
- Fixe horários claros de início e término (ex.: Natal das 12h de 24 a 12h de 25).
- Regule férias e viagens
- Divida as férias escolares com antecedência mínima (ex.: 30 de novembro).
- Viagens internacionais exigem autorização do outro genitor ou judicial (ECA, art. 83 e 84). Inclua prazo para fornecimento de documentos.
- Comunicação remota
- Defina janela diária curta e respeitosa (ex.: 10 a 20 minutos), proibindo ligações excessivas que atrapalhem a rotina.
- Em deslocamentos longos ou fusos diferentes: flexibilize horários e registre por escrito.
- Saúde e educação
- Responsabilidades: quem leva em consultas, quem autoriza procedimentos e como compartilhar documentos e resultados.
- Emergências: qualquer um pode autorizar atendimento, devendo avisar o outro o quanto antes.
- Despesas ordinárias x extraordinárias
- Ordinárias: moradia, alimentação, material escolar básico — geralmente cobertas por pensão ou rateio fixo.
- Extraordinárias: viagens escolares, aparelho ortodôntico, cursos não previstos — pagas proporcionalmente (ex.: 50 por 50, ou 60 por 40, conforme renda).
- Defina mecanismo de aprovação prévia e de reembolso com prazos.
- Condutas parentais e proteção da criança
- Proíba expressamente a desqualificação do outro genitor e a obstrução de contato (Lei de Alienação Parental).
- Estabeleça regras sobre horários, higiene, rotinas e uso de telas, mantendo coerência entre as casas.
- Solução de conflitos e revisão
- Cláusula de mediação semestral para revisão do plano ou resolução de impasses.
- Em caso de descumprimento reiterado, preveja prova documental (prints, e-mails) e possibilite a adoção de medidas judiciais.
Checklists rápidos
- Documentos: certidão de nascimento, RG, CPF, carteirinha do plano de saúde, carteira de vacinação, contatos da escola e pediatra.
- Logística: quem busca e leva, horários exatos, local de transição, plano B em imprevistos.
- Comunicação: canal oficial (app, e-mail), prazo de resposta, linguagem respeitosa.
- Segurança digital: fotos e dados da criança só com consentimento de ambos; sem exposição excessiva em redes sociais.
- Inclusão de avós: defina convivência saudável, sem sobrecarregar a agenda.
Erros comuns a evitar
- Texto genérico que não conversa com sua rotina real.
- Falta de alternância clara de feriados e férias.
- Silêncio sobre viagens e autorizações.
- Excesso de rigidez, sem mecanismo de revisão.
- Falta de previsão de mediação ou canal formal de comunicação.
Plano de convivência: modelo prático comentado
Use o modelo abaixo como base para dialogar, ajustar e levar à homologação. Ele não substitui a consultoria jurídica individualizada.
- Identificação das partes
- Genitora: Nome, nacionalidade, estado civil, profissão, RG, CPF, endereço completo.
- Genitor: Nome, nacionalidade, estado civil, profissão, RG, CPF, endereço completo.
- Filhos: Nome, data de nascimento, documentos.
- Premissas e princípios
- Este plano observa o melhor interesse da criança, a corresponsabilidade parental e a guarda compartilhada, nos termos dos arts. 1.583 e 1.584 do Código Civil, e do art. 227 da Constituição Federal.
- A residência de referência será o endereço da genitora ou do genitor, sem prejuízo da convivência ampla com o outro.
- Regime de guarda e decisões
- Guarda: Compartilhada.
- Decisões relevantes (saúde, educação, religião, mudança de cidade): tomadas de forma conjunta; em urgências, quem estiver com a criança pode decidir, informando o outro em até 24 horas.
- Convivência semanal e fins de semana
- Semana: dias e horários de permanência com cada genitor.
- Fins de semana: alternados, com retirada na sexta após a escola e devolução no domingo às 18h, salvo ajuste por escrito.
- Pontos de transição: preferencialmente na escola; na ausência de aulas, no endereço do responsável.
- Feriados e datas comemorativas
- Alternância anual, definindo horários claros para Natal, Ano Novo, Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais, aniversários da criança e dos genitores.
- Se a data coincidir com semana do outro genitor, prevalece a cláusula de data comemorativa, sem “perder” o próximo fim de semana.
- Férias escolares
- Divisão igualitária, com períodos e datas definidos até 30 de novembro de cada ano.
- Em caso de viagem, comunicar itinerário, hospedagem e contatos de emergência com antecedência mínima de 10 dias.
- Comunicação com a criança
- Chamada de voz ou vídeo diária de até 15 minutos às 19h, nos dias em que a criança não estiver com o outro genitor, salvo ajuste.
- Proibição de ligações excessivas que atrapalhem rotina, estudo ou sono.
- Saúde e educação
- Compartilhamento de boletins, relatórios e resultados de exames via e-mail até 48 horas após o recebimento.
- Consultas: alternância na responsabilidade de levar e acompanhar; emergências comunicadas imediatamente ou em até 24 horas, conforme gravidade.
- Despesas
- Ordinárias: cobertas pela pensão alimentícia ou rateio fixo, conforme acordo ou decisão.
- Extraordinárias: dependem de prévia aprovação por escrito; rateio proporcional à renda (ex.: 60 por 40); reembolso em até 10 dias mediante comprovantes.
- Viagens e autorizações
- Viagens nacionais: comunicação prévia de 10 dias com itinerário.
- Viagens internacionais: exigem autorização do outro genitor ou judicial (ECA, art. 83 e 84); parte que viajará providencia a autorização e documentações.
- Condutas parentais
- Compromisso de não desqualificar o outro genitor ou familiares perante a criança.
- Compromisso de não dificultar o convívio e de cumprir pontualmente horários e locais.
- Proibição de exposição excessiva em redes sociais.
- Solução de conflitos e revisão
- Em divergências, as partes se comprometem a realizar sessão de mediação no prazo de 15 dias, preferencialmente com terapeuta familiar ou mediador cadastrado.
- Revisões poderão ocorrer por consenso a qualquer tempo, com submissão à homologação judicial.
- Descumprimento
- Descumprimentos reiterados serão documentados e poderão ensejar medidas judiciais de revisão de cláusulas, fixação de multa ou outras medidas cabíveis, inclusive nos termos da Lei 12.318 de 2010.
- Vigência e foro
- O plano passará a valer a partir da homologação judicial e vigorará até nova decisão ou acordo.
- Foro competente: Vara de Família do domicílio da criança.
- Assinaturas e testemunhas
- Assinatura dos genitores e de duas testemunhas, com identificação completa.
- Solicitar homologação judicial para validade reforçada e exequibilidade.
Dica: anexe ao pedido de homologação um calendário ilustrado do ano corrente, com cores para cada período de convivência, facilitando compreensão e execução.
Situações especiais e como tratar no plano
Quando há mudança de cidade
- Defina com antecedência quais períodos serão concentrados com o genitor que se muda.
- Preveja custeio de deslocamento (quem paga passagens, traslados, documentação).
- Garanta a manutenção de vínculos locais (amigos, escola, atividades) e meios de comunicação frequentes.
Quando existem horários de trabalho atípicos
- Profissões com plantões (saúde, segurança, aviação) exigem plano flexível com janela de substituição.
- Estabeleça prazo mínimo para avisar trocas (ex.: 72 horas) e limite de remarcações por mês.
Crianças com necessidades específicas
- Inclua plano de cuidados, terapias e profissionais de referência.
- Defina quem acompanha em consultas, como partilhar laudos e como adaptar rotinas em ambos os lares.
Convivência com avós
- O art. 1.589 do Código Civil estende o direito de convivência aos avós, observando o melhor interesse da criança.
- Inclua dias e horários específicos, sem sobrecarregar a agenda da criança.
Quando procurar um advogado
- Quando houver desacordo relevante entre os genitores sobre guarda, residência de referência, escola, saúde, viagens ou mudanças de cidade.
- Para redigir, revisar e personalizar o plano de convivência, garantindo que as cláusulas estejam completas, válidas e exequíveis.
- Para homologar judicialmente o acordo e obter um título executivo judicial.
- Diante de indícios de alienação parental, descumprimento reiterado, risco à integridade da criança ou urgências (medidas liminares).
- Para ajustar o plano após mudanças significativas de rotina, cidade ou necessidades da criança.
Atos como consultoria jurídica individualizada, elaboração de documentos sob medida, peticionamento e condução de processos judiciais são privativos de advogados regularmente inscritos na OAB. Buscar apoio qualificado evita prejuízos, reduz conflitos e aumenta a segurança do arranjo familiar.
Conclusão
Um bom plano de convivência não é um “papel formal”: é uma ferramenta de cuidado com a infância e de organização da vida familiar após a separação. Ele traz previsibilidade, reduz conflitos, facilita decisões do dia a dia e, principalmente, atende ao melhor interesse da criança — que tem direito à convivência saudável com ambos os genitores. Com diálogo, mediação e orientação jurídica, é possível construir um plano claro, equilibrado e adaptável às mudanças naturais da vida.
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